quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A Insígnia da Máscara e os Diabos Mascarados – Parte 1

Mamba - a velha bruxa da montanha do Oriente


A HISTÓRIA DA MÁSCARA

A origem das máscaras remonta a reprodução das cabeças de animais nos rituais primitivos, onde eram imbuídos de um poder misterioso que autenticava a autoridade do sacerdote sob a tribo, e do âmbito religioso - reservado a alguns poucos - a máscara migrou para sua popularidade. A balaclava ucraniana veio mais tarde aderir ao mesmo fim que a máscara comum, ou seja, o da camuflagem, esconder o verdadeiro rosto e mostrar outro, e ainda, como nas saturnálias, teve o sentido de inverter os papéis de comando social.

Mais tarde ela foi adotada nas festas de carnaval e teve como função principal o efeito catártico, onde libertava os foliões dos sentimentos e pensamentos azedos. Nas festas de Epifânia, a máscara parodiava os membros do clero e a missa do burro onde era zurrada ao invés de rezada.

O carnaval originalmente era uma festa grega suscitada em 600 e 520 a.C., e propriamente consta que tinha sentido religioso e de agradecimento aos deuses pela colheita, representado pelo vale de Carna, a deusa Carna, passando para a interpretação posterior do latim no advento do cristianismo, como ‘carne vale’, devido o pós-festa no ‘adeus carne’ motivado pela igreja católica e sua criação da quaresma. O Carnaval em Roma se prolongava por sete dias nas ruas, praças e casas, indo de 17 a 23 de dezembro. Todas as atividades e negócios eram suspensos neste período carnavalesco de tempos vitorianos, pois era um tempo de alvedrio e os escravos ganhavam liberdade temporária para fazer o que almejassem e as restrições morais eram descuradas. As pessoas trocavam presentes, um rei era eleito por charada e comandava o cortejo pelas ruas (Saturnalicius princeps) e as tradicionais fitas de lã que amarravam aos pés da estátua do deus Saturno eram retiradas, como se a cidade o convidasse para participar da folia, e as máscaras ganhavam vida em todos os rostos. Esse costume originou as festas a fantasia.

O hieratismo da máscara carnavalesca na Europa, mais precisamente em Veneza vinha decorar o rosto de acordo com as vestes, e eram muito comuns as damas e cavalheiros usarem para encontros nas gôndolas, onde o clima de galanteio e romance reinava nas noites italianas. Tão importante a ser observado era o aspecto ético sobre a ‘capa’ da máscara, onde tanto o Bem quanto o Mal podiam ser camuflados pela máscara. Mais tarde os filmes dos heróis e seus respectivos vilões todos mascarados, com os propósitos de defesa ou ataque vieram confirmar isso.

Em Portugal e na Espanha, a máscara ibérica se tornou um projeto e, além disso, recebe o nome de diabo, e por vezes o fotógrafo lisboeta Hélder Ferreira faz crer em suas indagações que elas descendem dos cultos celtas, apesar das investigações enfermamente concluídas, como observaremos mais adiante. A máscara veio ganhar o seu glamour mais tarde com a chegada do teatro.

As línguas celtas não conheceram o nome máscara; elas o tomaram emprestado do latim ou do romano de acordo com a rica troca entre a cultura italiana e o povo do norte. Mas a arqueologia forneceu um certo número de camuflagens celtas (e diversas  figurações) e foi possível deduzir de algumas descrições mitológicas irlandesas que certas personagens ou enviados do Outro Mundo usavam máscara. O desaparecimento de todos os termos celtas originais com a cristianização permite suspeitar da existência de algum dado tradicional importante que não é mais acessível, nem mesmo pela tradição folclórica dos moradores dos países célticos, como a Irlanda.

O teatro surgiu como novidade artística na Grécia do século V a.C., trazendo normas estéticas, temas e convenções próprias. Segundo Aristóteles (384-322 a. C.), as principais formas dramáticas então conhecidas, a tragédia e a comédia, evoluíram, respectivamente, do ditirambo (hino em uníssono) e das canções fálicas, onde as máscaras cobriam cada personagem. O passo decisivo para a fixação e evolução desse teatro foi, sem dúvida, a instituição Estadual dos concursos públicos, em 534 a. C., o que coincide com a estabilização do governo democrático em Atenas. A regulamentação dos concursos exigia a inscrição, por candidato, de três tragédias e um drama satírico e mascarado. As trinta peças que sobreviveram de mais de mil escritas só no século V, são, ao lado da obra teórica de Aristóteles, excepcionalmente fragmentadas, os principais documentos que temos para embasar nosso conhecimento do que foi o teatro grego. Os efeitos visuais de espetáculo grego ficavam por conta da indumentária e do uso da máscara.

A máscara é um dos componentes mais importantes empregados na Catarsis, termo empregado por Aristóteles para definir a finalidade última da tragédia como sendo a purgação ou purificação das emoções de terror e compaixão. A complexidade de determinar um significado preciso para tal conceito está relacionada tanto a problemas de tradução quanto a problemas de interpretação. Catársis em grego pode significar tanto “purgação”, no sentido médico de limpeza do corpo, como “purificação”, no sentido religioso de limpeza de espírito.

A máscara teatral - que é também a das danças sagradas - é uma modalidade da manifestação do Self universal. A personalidade do portador em geral não é modificada; o que significa que o Self é imutável, que ele não é afetado por essas manifestações contingentes. Sob outro aspecto, entretanto, uma modificação pela adaptação do intérprete ao papel, pela sua identificação com a manifestação divina que figura, é o próprio objetivo da representação. A máscara, especialmente sob seus aspectos irreais e animais, é a Face divina e mais particularmente a face do Sol, atravessada pelos raios da luz espiritual. Assim, quando nos dizem que as máscaras de t’ao-t’ie (glutão) foram progressivamente humanizando-se, não se deve ver nisso um sinal de civilização, mas o esquecimento crescente do valor do emblema.

É notório que tudo o que é tradicional veio do Oriente para o Ocidente, e sendo assim, melhor seria iniciarmos uma análise do simbolismo da máscara a partir do nascedouro que pode dar ‘Orientação’ para esta apreciação, mas isso é coisa para a próxima publicação.


Postarei as referências bibliográficas na última publicação sobre a insígnia da máscara.


Por Sett Ben Qayin 

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