PARTE 2
- A Morte, O Poder e a
Nova Vida –
A
morte é necessária para uma iniciação, para que haja uma ruptura entre a velha
vida e a nova vida que se iniciará. Aqui a morte é o aspecto destrutivo e
perecível da natureza. Ela indica aquilo que desaparece na evolução
irreversível das coisas, e está ligada á terra, mas a morte é em si mesma a
introdutora aos mundos desconhecidos dos Infernos e Paraísos, e nesse aspecto
ela se aproxima dos ritos de passagem.
Ela
é introdução e revelação. Todas as iniciações atravessam uma fase de morte,
antes de abrir o acesso à uma nova vida. A morte liberta das forças
regressivas, desmaterializando o negativo, o que não tem mais que existir, e
libera forças de ascensão do espírito.
Se
ela é por si mesma, filha da noite e irmã do sono, ela possui, como sua mãe e
seu irmão, o poder de regenerar. Se o ser que ela abate vive apenas no nível
bestial e material, ele fica nas sombras dos Infernos; se, ao contrário, ele
vive no nível espiritual, ela lhe revela os campos da luz. A vida e a morte
coexistem em todo ser humano e para todo ser humano, ou seja, há uma tensão
entre duas forças contrárias que se amam, se renegam, e não ‘são’ uma sem a
outra.
Dispater
(Plutão no mito romano) do qual fala César no De Bello Gallico, e do qual todos
os gauleses se dizem descendentes é em princípio o mesmo Deus da Morte, e tem a
mesma função para todos os países e culturas bruxas. A simulação dramatizada em
todos os ritos iniciáticos deve ser tão bem feita quanto possível, provocando a
catarse transformadora, a transmutação de valores, cuidados e amor, requisitos
primordiais e eternos que são condutores da desgraça de qualquer falso alicerce
que permeou a mente, o coração e o espírito do indivíduo enquanto grilhões
ausentes de virtude do Espírito. O Deus da Morte é o pai da raça Bruxa, e a
contraparte sombria da divindade soberana de acordo com Ógmios ou Ogme.
A
alegoria da morte na Bretanha armoricana, o Ankou, é a continuação do condutor
dos mortos da dança macabra da Idade Média e, apesar da cristianização, do
Ógmios condutor dos mortos, o executor das forças mercuriais, e por isso, o
mistério da morte é tradicionalmente sentido como angustiante e figurado com
traços assustadores. É levada ao máximo, a resistência à mudança e a uma forma
de existência desconhecida, mais do que o medo de uma absorção pelo nada. A
morte se justifica em si mesma, sem ser o fim absoluto ela mesma.
Em
Pausânias, Descrição da Grécia, 10, 28-31, Eurínomo figura a morte devastadora
em um gênio infernal, cuja função é devorar a carne dos mortos e não deixar
senão os seus ossos. O direito de vida e, de modo correlativo, o direito de
morte pertencem aos deuses. As principais divindades letíferas, depois de Júpiter,
são Minerva, Apolo, Diana, Marte, Hécate e Prosérpina. Faço um parenteses para lembrar que Lupercus é filho de Marte.
A
morte é personificada por Tânatos, filho da Noite e irmão do Sono, arisco,
insensível, impiedoso. Na iconografia antiga a morte é representada por um
túmulo significativo do último lar ou portal para o submundo, com uma divindade
armada com uma foice saturnina devorando um ser humano entre suas mandíbulas,
um gênio mercurialmente alado, dois jovens, um negro, o outro branco, um
cavaleiro, um esqueleto, uma dança macabra, uma serpente ou qualquer outro
animal psicopompo (cavalo, lobo, cachorro, etc).
O
número 13 é o número da morte, e os dois também aparece no tarô, e com efeito,
sua significação é maléfica, constante na idade média cristã, já aparecia na
antiguidade simbolizando o curso cíclico da atividade humana, a passagem a um
outro estado e, por consequência, a morte, e tudo isso está no poder que se
recebe na passagem do dom, onde se herda os dons transmitidos pelo seu
iniciador, ou como quando se recebe o legado cuja posse desse poder é
compartilhada ou soprada pela vos, transferida de artéria para artéria, de
espírito para espírito, de corpo para corpo. O poder que a morte fornece é a
maldição da qual só os sábios podem transformar em benção.
O
Ceifeiro da morte exprime a evolução importante, o luto, a transformação dos
seres e das coisas, a mudança, a fatalidade (The Fate action) irreversível, e
de acordo com O. Wirth, a desilusão, o desprendimento, o estoicismo, ou o
desencorajamento e o pessimismo.
Jean Vassel constata em “Études
Traditionnelles” nº 278, setembro de 1949, p. 282, que A Morte constitui uma
cesura na série das imagens do Tarô, vindo, em seguida, os arcanos mais
elevados, de tal modo que se pode fazer corresponder os 12 primeiros aos
pequenos mistérios, e os seguintes aos grandes mistérios, já que fica claro que
as lâminas que a seguem têm um caráter mais celeste do que as que a precedem.
Como o Mago, a Morte corresponde na astrologia à primeira casa do horóscopo. Em
sua constituição, a lâmina da Morte possui um esqueleto armado de foice,
suficientemente eloquente para não necessitar comentários, todo cor de carne, e
não ouro, um pé afundado na terra, tem na mão esquerda uma foice de cabo
amarelo e lâmina vermelha, cor de fogo e de sangue, o sangue da linhagem que
segue, para nos advertir de que a morte de que se trata não é a primeira morte
individual, mas a destruição que ameaça a nossa existência espiritual se a
Iniciação não a salvar de si mesmo e da aniquilação que isso causa.
Sem
mais delongas, ficarei devendo um assunto o qual deixarei para o próximo
ensaio, mas como a morte não é um fim em si, ela abre o acesso ao reino do
Espírito, por isso todas as coisas espirituais só podem ser acessadas após a
morte, que revela a vida verdadeira, como mors janua vitae (a morte, porta da
Vida).
Com ela há uma mudança profunda que o indivíduo passa por efeito da
iniciação, o profano deve morrer para que renasça à vida superior conferida
pela iniciação. Se não morre para seu estado de imperfeição, impede para si
próprio qualquer progresso iniciático, e não há rito iniciático que não a
contenha em seus episódios iniciatórios, ali, a serpente troca de pele, o lobo
troca de pelo, a ave troca de pena, a lagarta vira borboleta, a fênix volta das
cinzas, o barro vira lama a ser descartada, os vícios viram virtudes em poder,
o chumbo vira ouro, e o olhar para o mundo é o da nova vida, uma vida
inteiramente jovem e diferente, com propósitos mais elevados, novas metas,
novas possibilidades, novos objetivos, novos nomes, novas pessoas, novos
caminhos, novo por dentro e por fora, novos alicerces, etc., e por fim, há que
se convocar um morto para viver novamente!
Sett Ben Qayin
aquele que crê na imortalidade ,encontra uma morte gloriosa-Eliphas Levy .
ResponderExcluir"e por fim, há que se convocar um
ResponderExcluirmorto para viver novamente!"
Isso entra meio do "nada" no texto, que entrelinha foi essa ein?
;D
Oi Artur, essa 'entrelinha' é um trocadilho iniciático. Muitos bruxos por ai posam de 'phodões' ou ameaçadores. Mas será que são mesmo?
ResponderExcluirNo artigo é interessante notar que a transmissão de poder se dá no horizonte da iniciação, onde, supõe-se que em alguma vida (seja passada ou não) recebeu a transmissão em algum momento.
A partir dai vemos o poder real, o controle de si mesmo enquanto lição alquímica de casa e um novo alvorecer da madrugada bruxa. É nesse momento que descobrimos como conjurar um morto para assinar um testamento que ele esqueceu de assinar antes de morrer, e isto está relacionado à morte iniciática. ;)