sábado, 11 de janeiro de 2014

As Fadas Romanas


Fates

Entende-se por religião romana o conjunto de crenças, práticas e instituições religiosas dos romanos no período situado entre o século VIII a.C. e o começo do século IV da era cristã. Porém há muita confusão quando se fala sobre fadas no ‘mundo romano’.

Em primeiro lugar, devermos compreender que fada não é um conceito celta por absolutismo, mas a compreensão de que fadas não são mulheres com asas de borboletas é entendimento comum entre inúmeros bruxos, os quais as veem como são, ou seja, o povo de Elphame, os mortos - ancestrais por linhagem sanguínea e/ou mítica, inclusive.

Então, vamos dar uma olhada no que os autores escreveram sobre isso?

Schoereder diz que o nome fada vem do latim fatum, que significa fado, destino. Apesar disso, há uma tendência em meio a alguns pesquisadores que querem fazer parecer a palavra fada oriunda do termo Pher usado por Homero para indicar os centauros mitológicos. Fato é que em 1599 a Inglaterra teria feito alçar voo às estórias de fadas com os contos dos anéis de fadas, uma alusão aos cogumelos amanita muscária, os quais são enteógenos usados nos trabalhos de transe de algumas bruxas oraculares que intermediavam os reinos (dos vivos e dos mortos) para cuidar do que poderia vir acontecer.

O feitiço sendo uma palavra que os portugueses levaram para a África e de lá voltou com os franceses como fetiche, tem sua origem no latim romano facturus, (ação sobre o futuro), a mesma ordem de palavras que designam “feiticeiras”, ou facticius, de Fatus, fado, diferente de Fortuna, mas não de Sors (sorte/destino), diferenciando da palavra Saga-ãe (bruxas que nasceram em Roma), porém tinham suas companheiras de equilíbrio, as Fúrias Dirae, fadas infernais tomadas como demônios por alguns autores, as quais desequilibravam as emoções de quem não podia suportar o seu destino ou controlar a si próprio.

Como sabemos, o sânscrito gerou o latim e podemos encontrar significados reveladores entre essas duas línguas, assim como Aca Larência, onde Acca é um termo onomatopaico da linguagem infantil para designar “mamãe”, como o sânscrito akkã.

Larentia é um derivado de Lar, Laris, e no plural: Lares, -um, -ium, “espíritos tutelares”, tido como alma dos mortos, familiares ou públicos, encarregados de proteger as famílias, as casas, as ruas e as cidades. O mistério que envolve Larentia e a deusa Lupa (a Loba), está no fato de ter se tornado nome próprio e passou a designar a esposa do pastor Fástulo, como mãe de criação de Rômulo e Remo. Deu à luz doze filhos, com os quais fazia, de contínuo, sacrifícios para a fertilidade dos campos. Com o falecimento de um deles, Rômulo ocupou-lhe o posto e fundou o colégio dos 12 Irmãos Arvais.

Ovídio fala em seu Fast sobre Accalia ou Larentalia, que mais tarde passou a ser conhecida como Lupercália. Uma outra variante dessa história nos foi contada que foi habilmente construída, intencionalmente para que os romanos se apossassem de vastos latifúndios, há muito reivindicados pelo Estado, que diz no reino de Rômulo, tido as vezes como Anco Márcio, durante uma festa, o sacerdote que guardava o templo de Hércules desafiou o herói para um jogo de dados (o mesmo que mais tarde veio tomar lugar nos ossos de Astragalomancia), estabelecendo-se que o vencido ofereceria ao parceiro um jantar e a mulher mais bela, sensual e elegante de Roma. Derrotado pelo filho de Alcmena, o sacerdote cumpriu ambas as promessas: além de um lauto banquete, entregou ao herói a jovem Aca Larência, lindíssima cortesã romana. Ao deixá-la, para retomar os seus trabalhos, Hércules aconselhou-a a entregar-se ao primeiro homem que encontrasse. Aca assim o fez, casando-se logo depois com o varão que o fado lhe destinara pelos lábios de seu ex-amante.

Tratava-se de Tarúcio, riquíssimo cidadão etrusco, proprietário das melhores glebas que circundavam Roma. Morto prematuramente o marido, Aca, antes de falecer, legou todos os seus bens ao povo romano. Depois de muito idosa, Aca desapareceu misteriosamente, bem perto do Velabro (mercado de azeite e comestíveis), junto ao túmulo, onde repousava a esposa do pastor Fáustulo. À ela passou-se oferecer louros no fogo da lareira pública, e posteriormente na lareira doméstica, assim, aos poucos ela se fundiu (ou confundiu) com Vesta, a Dama da Lareira espiritual, ao lado de Mania como senhora do Fogo da Lareira dos Lares, a qual Ernout-Meillet incansavelmente decifrou e definiu o significado pelo sânscrito Vásati (reside permanente), e dessa forma ela foi aproximada da grega Héstia e designou Lareira para sempre devido o Arcádio Wistías. Tal tema foi muito prolixo em H. Frisk, Griechisches Etymologisches Wörterbuch e nos dicionários míticos religiosos da mitologia grega e da mitologia romana em que se segue a hipótese de P. Chantraine, para efeito de referências.

Fado no sentido absolutista, é um tipo de sentença das Parcas, é um conceito moderno para uma decisão sentencial e teve como destino o seu cumprimento, sendo um destino que não se controla, apesar de se poder mudar parte dele em decorrência de certas defesas, esse conceito foi introduzido no mundo do Direito romano e é ainda hoje estudado nas faculdades de Direito e ciências jurídicas. Nesse conceito moderno as Parcas dão sentenças punidoras, mas originalmente as Parcas não tinham essa função, entretanto vou deixar pra explanar isso mais em baixo.

Fortuna é o feminino substantivado e depois divinizado de um adjetivo fortunus (ver origem de Fors) e assim, a deusa que podia ser secunda, prospera, aduversa (boa ou má), opondo-se à razão (ratio) e ao controle foi equiparada à grega Týkhe que significa “conseguir por sorte ao acaso”, Fortuna ficou confundida com Fado, devido a má interpretação do Acaso, e Fortuna passou ser aquilo que o homem consegue, alcança, realiza por decisão dos deuses. Aqui Fortuna dá sentença boa e favorável, nada punidora. Fortuna passou a ser “o piloto da vida dos mortais” para uma boa vida, e seu culto foi trazido para Roma por Sérvio Túlio, o qual tem uma história bem interessante com a deusa, contudo, ela tomou vários epítetos como Fortuna Redux, Fortuna Publica, Fortuna Huiusce, longe daquele último.

Há quem diga que Fors Bona se tornou Fortuna, porém, Fors em princípio era o Acaso, e enquanto nome comum foi usado no nominativo singular fors e no ablativo forte, os outros casos foram dados à Fortuna. Como nome próprio, acoplado a Fortuna, Fors Fortuna emprega-se em todos os casos do singular. Fors provém do antigo fortis, como apareceu na comédia de Terêncio, Phorm., 136-137. Fors se tornou o princípio masculino de Sorte (boa ou má), formando com Fortuna um par, uma dupla que se integra e se complementa. O macho e a fêmea se conjugam na fórmula Fors Fortuna, que se fecham numa sizígia, para designar uma única divindade andrógena e completa.

Fadas de William Blake - Hécate ou as três Fates

Sobre a Sibila, Frisk reuniu a melhor etimologia, sendo que as de Carnoy não são aceitáveis. Heráclito (séc. VI a.C.) fr. 92 Diels, foi o primeiro a se referir à Sibila, “atribuindo-lhe inspiração divina”. 

O fragmento em apreço chegou até nós graças à Plutarco, De Pyth. Or., 6, 397ª, e a tradução que segue é da lavra de Carlos Alberto Louro Fonseca (Os Filósofos Pré-Socráticos, Lisboa, Calouste Gulbenkian, 1982, p. 215): “A Sibila, que, segundo Heráclito, profere, com a boca possessa, palavras sombrias, sem adornos e sem perfume, atinge com a sua voz mil anos, graças ao deus Febo”, Sibila foi confundida com Pítia e foi assimilada com sentido igual. Em Cumana, cidade de Cumas, no sul da Italia, e Tiburtina, de Tíbur, cidade vizinha de Roma, haviam seus oráculos entre outros lugares, não vou evidenciar as coisas gregas aqui, só as romanas, porém farei algumas menções. A primeira Pitonisa, consoantemente, foi uma jovem cujo nome era Sibila, filha do troiano Dárdano e de Neso, filha de Teucro, fundador da dinastia de Ílion. Com o respaldo de Apolo, deus eminentemente troiano, Sibila adquiriu tão grande reputação na arte mântica, que todas as demais profetisas adotaram-lhe o nome.

Voltando as Parcas, no plural Parcae, provém do verbo ‘parere’, presente pario, de parir, mas no sentido de “gerar, dar à luz, pôr no mundo”, contudo, o sentido primitivo era o de “produzir”, como se expressou Catão, em De Re Rust., 89,1. Todavia, segundo Ernout-Meillet, o sentido de “pôr no mundo” não possui expressão conhecida no indo-europeu. Gignere e nasci, “engendrar”, gerar e nascer, vir ao mundo, têm uma acepção social e jurídica e não física. O significado geral em parens, -ntis, que se aplica tanto ao pai quanto à mãe, mostra que o sentido inicial de parere não era “o parto através da mãe”, mas o de “produzir”, como revela o grego tekeîn. As Parcas eram, pois, em princípio, tradicionalmente as divindades que “produziam”, provocavam o nascimento e depois também o casamento e a morte, eram essas suas funções. Não dirigiam acontecimentos por destino, nem os rumos deste, bem como não tinham poder sobre qualquer outro rito de passagem (ou a passagem propriamente dita, além das que foi citada como função), que ocorria na vida de alguém.

Na religião romana, as Parcas, com seus nomes de Nona, Decuma e Morta, (Nona, Décima e Morte), eram as promotoras ou paraninfas do nascimento, casamento e morte. Como o ano era lunar e a religião romana era essencialmente preventiva, as duas primeiras presidiam, de início, o nascimento, pois a criança nascia no décimo mês, daí o temo Décuma, mas como poderia vir um mês antes, Nona então atribuía suas habilidades para assistir a parturiente. Com o tempo Décuma passou a reger um novo nascimento chamado: casamento, e Morta, que possui a mesma raiz etimológica de Moira, com influência de mors, continuou a presidir a morte e dando descanso para as almas. Essa última era um espírito que trabalhava para a morte, não era a morte propriamente dita. 

Com o tempo mais adiante, tomou influência grega e as Parcas identificaram-se com as Queres helênicas, Cloto, Laquésis e Átropos, projeções ou emanações da Moira, as executoras do que foi por esta determinado. Moira era grega, e era a sentenciadora do destino e assim os povos converteram as Parcas em fiandeiras da vida e da morte, lidando com o fio que desenrolava, escolhiam para quem dar o fio e quando cortariam o fio. Não é em vão que se encontra, por vezes, em latim, Parca no singular como sinônimo de Moira, Destino, segundo se pode ver em Horácio, Od., 2, 16, 37-40. No Fórum, as Parcas foram posteriormente representadas por três estátuas comumente denominadas por As Três Fadas, Tria Fata, sob conotações gregas das Moiras, foram tomadas por: os Três Destinos e assim, fada se confundiu com destino na era moderna.

As fadas foram concebidas pelo povo celta de acordo com a visão de mundo que o povo do norte tinha, ou seja, juntamente com a lenda dos Tuatha de Danan que foram morar debaixo da terra, isso, para eles, era melhor que dizer “eles morreram”. Quando os romanos conquistaram o mundo celta, tomaram contato com suas lendas, mitos e religiosidade, assim, conheceram o que os celtas pensavam sobre as fadas e como elas eram vistas e representadas, como espíritos ancestrais que cuidavam do destino da pessoa, da família, e do clã, condado, ou “cidade”.

No mundo romano a acepção de ‘fadas’ foi entrelaçada com a Moira grega, assim como aconteceu com as Parcas, senão vejamos:

Fatus veio depois de Moira e é correto o sincretismo entre Fado e Moira, mas é incorreto sincretizar Moira com Parcas. Fatum, personificado e divinizado com o sentido de “Destino”, fez jus na língua popular a um masculino Fatus e até a um feminino Fata, que nas línguas românicas se perpetuou com a acepção de “fada”. Isso tudo segundo Junito de Souza Brandão, o Dr. Eduardo Nélson Corrêa de Azevedo e Heraldo José Abreu Leitão, bem como o apoio que Lúcia Helena Rios Seabra deu a todos, entre outros catedráticos e autores.

Fatum, Fado, o Destino, é da mesma família etimológica que o verbo fari, “contar, predizer, profetizar”, é a revelação da sorte, onde sorte quer dizer destino, como já observava Varrão, L. 1. 6, 52: Ab hoc (SC. Fari) tempora quod Tum pueris constituunt Parcae fando, dictum fatum et res fatales, ou seja, porque as Parcas predizem, em falando, o tempo de vida das crianças, que o destino e o tempo fixado pelo Destino, o dia fatal, derivam seu nome. Fatal está para morte, Fata está para morte, Fada está para morte. O fado seria assim uma anunciação divina. Diz-se que, a Fada fala sobre Fado, ou, o Morto fala da sorte/destino.

Fata Morgana by Manuela Cuccu

O grego possui um presente correspondente a fatur, “ele diz, prediz”, no dórico phamí, ático-jônico phemí, “eu manifesto, torno visível, digo”. Disso originou-se a Fama.

A raiz encontra-se igualmente no inglês antigo boian, “vamgloriar-se”, armêmio bay, “diz ele”, eslavo antigo baliji, “bruxo, feiticeiro”, donde “médico” é correto.

Fatum, o Fado, o destino, mais empregado no plural fata, -orum, (só na Eneida o plural é usado centro e quatro vezes contra quinze) tem por correspondente semântico em grego (heimarméne), “partilha, necessidade”, da mesma família etimológica de Moira, “parte que toca a cada um”, quinhão, destino, herança, já que ambas provém do verbo meíresthai, “receber uma parte, tomar uma parte, partilhar”. Cícero, em Nat. Deaor., 1, 20, 55, assinala o fato> Illa fatalis necessitas quam (heimarménen) dicitis – aquela fatal necessidade a que chamais heimarménen.

Foi com o significado de “falar, predizer”, do verbo fari, que Fado passou a designar a vontade expressa pela “palavra” de um deus.

Com a influência sempre crescente da religião helênica, em que Moira, (Destino cego) se projetou nas três Queres, Cloto, Laquésis e Átropos, o Fado teve como hipóstases as três Parcas, Nona, Décima e Morta, passando até mesmo a designar as Sibilas. Em Roma, junto aos Rostra, “Rostros” (tribuna para os oradores na praça pública, púlpito este ornamentado com “esporões” de navios inimigos), havia três estátuas denominadas Fata, Fados, que representavam as Sibilas.

O masculino Fatus, Fado, mencionado linhas acima, converteu-se com o tempo numa espécie de Gênius, Gênio, simbolizando o destino individual masculino; Fata “Fada”, traduzia por oposição, o destino feminino, “equivalente tardio da Juno primitiva, como acentua Grimal.

Na literatura grega, Iliada, XXI, 82-83; XVI, 440-443; XX 125-128 para citar alguns passos, Zeus se identifica com a Moira, ora parece que até poderia modificá-la, se o quisesse, ora parece a mais temível das divindades paira acima do pai dos deuses e dos homens, como demonstrou o livro de Mitologia Grega, Vol. I. p. 141 sq.

Na literatura latina, o mesmo ocorre. Em Eneida 1, 257-264; 5, 784; 10, 34-35; 6, 376, o problema é exatamente o mesmo. O Fado e Júpiter se alternam e parecem, por vezes, identificar-se, e por último, a inalterabilidade dos Fata é sumariamente decretada, como diz a Sibila a Palinuro, que, insepulto, desejava através de súplicas a Eneias, valido dos deuses, atravessar as águas do Estige, Em., 6, 376:

Desine fata deum flecti sperare precando, ou seja, perde a esperança de dobrar com rogos os fados dos deuses. Ambos, deuses e fatas se confundem numa mesmo personagem, porque são os mesmas, fado e fada são um só deus/deusa igualmente.

Na próxima postagem daremos continuidade à esse assunto, explorando o mundo das Lasas e das Ladas.



Sett Ben Qayin


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