Eu aprendi que reflexão
e respeito são palavras primas, onde uma significa dobrar-se novamente, a outra
significa olhar outra vez, no sentido de revisar. A ideia de que algo mereça um segundo olhar em geral merece respeito.
Como estou na beira das
quarenta e uma primaveras, venho agradecer tudo que me foi dado e desejado, mas
também agradecer tudo pelo qual dei meu suor. A gratidão é imensa e é essa
energia que me motiva um segundo olhar, para reflexão e agradecimento por todo estágio
terrestre e espiritual cursados até o momento.
Aprendi desde pequeno a
chupar jabuticaba no pé e amora também. Eu acompanhava meu avô no matadouro e
ajudava a salgar a carne do boi que morria para nos alimentar, fazíamos mocotó
no fogão à lenha e na escola alguns alunos me apelidavam com as alcunhas que
mais me ofendia, e eu não compreendia porque isso ocorria. O mocotó que meu avô
fazia ficava por horas cozinhando ali. Também pescávamos juntos no Jacaré, o
rio próximo de onde morávamos, e eu queria aprender a pescar como ele. Até que
um dia pesquei minha primeira tilápia e assim fui adquirindo experiência. Meu
avô não pescava para mim, ele me ensinou a pescar o meu próprio peixe.
Aprendi cedo que as
mudanças aconteciam dentro e fora de mim, que perdíamos entes queridos, que eu
me via de um jeito, mas era visto de outro pelas pessoas ao redor. A fé que eu
via ser praticada dentro de casa era diferente e mesclada com que havia lá fora.
Aprendi que eu seria discriminado pelo que eu sou e pelo que eu acredito e fui
me preparando ao meu modo, os parentes adultos falavam que a superação de
obstáculos e dificuldades era uma das responsabilidades e quesito de sobrevivência,
e que tudo isso vinha num pacote fechado contendo a parcela de dor que sempre se
apresenta para o nosso amadurecimento e esse ensinamento foi reforçado pelas educadoras
e educadores que caminham há mais tempo nessa vida.
Ensinaram-me que
discursos têm propósitos e que algum dia, um discurso viria para ferir ou curar
e que eu tinha de aprender a lidar com isso. Diziam: “não importa o quanto você
se esforce, jamais conseguirá agradar a todos e sempre haverá alguém que você
ama que um dia irá vestir-se com a capa do vilão só para poder te fazer
enxergar mais longe”. No início eu não acreditava nisso, mas com o passar do
tempo pude ver com meus próprios olhos. O termo Mahavakya em sânscrito vem
significar “discurso”, e especificamente, o discurso sobre um tema filosófico e
elevado. Tomei esse exemplo como um bem que me traduz numa boa pessoa se eu
achar o caminho que perdoa o vilão. Mas o mais difícil foi descobrir o que eu
sentia dentro do peito e dar nome aos bois ou adivinhar o que era tal
sentimento que ocorria ali dentro. Foi assim que tentei me desvendar, iniciando
um caminho de busca. Graças aos deuses, a generosidade e a compaixão dos
adultos sempre circulavam ao meu redor.
Mahavakya
Ratnamala diz que o conhecedor da verdade, deve andar pelo mundo sob a
aparência estúpida de uma criança, um louco ou um diabo. Então a grande lição
que tive é a que tenho de perdoar todo mundo, pois sempre em algum momento da
vida somos considerados infantis, às vezes loucos, e muitas vezes diabo de
alguém.
Aprendi que debaixo da minha aparência física,
existe uma pessoa linda, que aprecia, que ama, que compreende, que admira, e
que gosta de receber isso de volta, a maior das lições ainda na infância foi
aprender a lidar comigo mesmo nas situações onde eu não recebia isso de volta,
e amadureci na marra. Não adianta alguém dizer para você que se você enfiar o
dedo na tomada você vai levar um choque. Você tem que levar o choque para
aprender que fogo e eletricidade queimam e causam uma série de transformações.
Aprendi que falar com doçura é necessário para
desarmar as comportas dos ouvidos, e aprendi que não posso escolher como me
sinto, mas posso escolher o que fazer com isso e por essa razão já magoei
pessoas que amo quando eu não sabia escolher direito, e já fui magoado por elas
também quando eu não sabia filtrar minhas águas. Aprendi que a única linguagem
eterna é a do amor, e ela é para todos! Esteja na idade que estiver o amor
sempre nos abraça.
A linguagem do amor não cresce conosco, mas nós
crescemos com ela. Como disse Shakespeare: “da amizade sincera, amor não é amor
se com obstáculo se altera”.
Aprendi a ser simples
com os simples, intelectual com os intelectuais, a ser igual com os iguais e a
ser desigual com os desiguais, aprendi a ler o que todo mundo lê, e aprendi a
não carregar nos ombros mais do que eu suporto. A vida exige isso de nós. Aprendi
a amar de várias maneiras, e nenhuma delas parecia ser a correta, porque eu não
estava pronto ainda. Só depois de aprender a liberar o amor que estava dentro
de mim que então aprendi a amar de fato. Amar sem esperar nada em troca, amar
sem criar expectativas, pois essa é a mãe de toda frustração. Aprendi a amar
sem endeusar alguém.
É por ver o amor em meu
coração, que venho fazer essa reflexão, listar algumas coisas que aprendi e dar
graças à tudo isso. Claro que, nem tudo que aprendi poderia ser listado aqui.
Eu aprendi a ler o Menestrel de Shakespeare e aos poucos resolvi colocar em
prática, é difícil, mas não impossível. Eu aprendi a desabafar nos ouvidos de
um bode, e um dia esse bode me falou:
“Sabe Cléber, certa vez, na Grécia Antiga, numa
época em que os deuses ainda andavam pela Terra, um espécime de um determinado
mamífero plantígrado, o urso, estava passeando pelas planícies calmas da
Beócia. Foi
quando ele teve o azar de passar perto do lugar onde o deus Hermes estava
treinando o arremesso do disco para uma competição que ia ter lugar no Monte
Olimpo. Ora, o deus era cheio de habilidades, mas era uma negação no arremesso
do disco. Todos já imaginam o que aconteceu: o disco se desviou e bateu na
cabeça do pobre urso, que só pensava em achar uma colmeia bem gostosa e nada
mais. Furioso da vida, ele se dirigiu para onde estava o deus e o encheu de
desaforos. Esqueci de dizer que, nessa época, os ursos eram dotados de cordas
vocais e falavam. Ora, o deus, embora culpado, não gostou de ser xingado desse
jeito pelo animal. Imediatamente deu a ordem mágica de que esse gênero perdesse
o dom da fala. Tanto isso é verdade que a prova está aí: até hoje esse animal
não diz uma só palavra. Mas, a partir desse episódio, a união das palavras
disco e urso originou
Discurso!”
Então o bode filho da viúva me
perguntou: “resta saber se você é o urso ou se você é o Hermes, então, qual
deles você é?”
Por
isso eu trago o Soneto LXXXVIII do William Shakespeare para exemplar o que se
passa em meu coração nesse momento, e eu poderia deixar a cargo do leitor para
descobrir se sou o urso ou se sou o Hermes, mas o fato é que não sou nenhum dos
dois, eu sou apenas o Cléber e quero o seu bem, na forma exata como mostra o
Soneto:
“Quando
me tratas mau e, desprezado,
Sinto que o meu valor vês com desdém,
Lutando contra mim, fico a teu lado
E, inda perjuro, provo que és um bem.
Conhecendo melhor meus próprios erros,
A te apoiar te ponho a par da história
De ocultas faltas, onde estou enfermo;
Então, ao me perder, tens toda a glória.
Mas lucro também tiro desse ofício:
Curvando sobre ti amor tamanho,
Mal que me faço me traz benefício,
Pois o que ganhas duas vezes ganho.
Assim é o meu amor e a ti o reporto:
Por ti todas as culpas eu suporto.”
Não há inimigos na morte, há amor, perdão e
gratidão! Há pessoas que pensam para fazer e há pessoas que têm certeza do que
estão fazendo. Eu gosto das que pensam.
Aprendi que alma não tem sexo, e que espírito
também não tem. Aprendi a acreditar numa sequencia vital chamada ciclos de
reencarnação, por isso já fomos homens, já fomos mulheres, já passamos por
todas as cores e sexos, e quem não passou irá certamente passar, assim como a
vida renasce em toda primavera.
Aprendi que todo contrário também é verdadeiro, então não vivemos mais de uma vez no mesmo formato, bem como não há morte permanente, assim aprendi que tudo nesse mundo e no outro podem ser questionados, e ainda, que quando alguém abre um discurso contra ou a favor a nós, sempre nos reservamos o direito de defesa. Aprendi que nesse ínterim a bandeira branca que levantamos é sinal que os fantasmas foram vencidos. É nesse sentido primaveril que inicio a jornada em um exílio verdadeiramente pacífico e abstinente de emoções. Aprendi que o único e legítimo sentimento que existe é o amor, o resto é criação mental chamada emoções.
Aprendi que verdades são passageiras, fragmentadas e individuais. E elas sobem ou não uma escada junto conosco. Nessa subida para alcançar o divino, muitas vezes precisamos tomar um passo abaixo na escada, para depois retomar a subida.
Aprendi que tenho de engolir sapos e cobras para
me transformar neles e estou aprendendo aos poucos a não fabricar oponentes. Silvanus
Yonphá me disse uma vez antes de fazer a passagem: “Cléber, você sabe o porquê a serpente mãe
pica a serpente filha logo que ela nasce? eu respondi que não sabia então ele
suavemente e sorridente disse: é para a serpente filha aprender a ser cobra
desde cedo!”
Eu aprendi que nós não
devemos afastar de nós aquilo que não gostamos, porque justamente o que não
gostamos é que encontra ressonância dentro de nós.
Aprendi
a falar do sábio, não de mim, eu falo de exemplos que os sábios me deram.
Graças aos deuses, até hoje só estive em companhia de gente mais sábia que eu.
Durante o processo de aprendizado com esses sábios, eu bati boca muitas vezes,
o caminho não é fácil, nunca ninguém disse que era fácil, e eu aceitei. Por
isso digo: Eu amo cada um dos meus mestres e mestras que tive. Obrigado por
todo vosso ensinamento que me fez ser o que sou hoje.
Aprendi que as primaveras mudam meus pelos e minha pele naturalmente todos os anos, e aprendi a não “ter”, mas “ser”! Aprendi que ninguém consegue deformar alguém sem uma fôrma de bolo ou uma cama de Procusto, e aprendi que não quero isso para mim. Aprendi a me libertar de dogmas, do medo do diabo, do medo de um deus e de alguns vícios, aprendi a buscar algumas virtudes que não nasceram comigo. Aprendi que algumas coisas nessa vida a gente só consegue através do escambo, enquanto outras são conseguidas com o amor.
Aprendi que as 4 estações simplesmente ocorrem, e ocorrem para todos. Não importa a orientação filosófica ou religiosa de alguém, ninguém nunca poderá dizer quem você é. Só você pode! só você sabe com que dons ou ausência deles você nasceu.
Dessa forma, para ser GOOD, seria bom
entender GOD, que veio do inglês arcaico GOD (virtuoso, desejável, valioso,
considerável) e gerou GOOD que tem as qualidades certas para ser aceito e
continuar no entre-a-gente, já que aquele veio do Germanico Gothaz que
significa “adequado, fazendo parte de”. Aprendi que, meu filho é
meu único herdeiro e legítimo descendente, e ele têm me ensinado a ser um bom
pai, porque eu não nasci sabendo como é ser um pai.
Aprendi que o Love, também veio do Inglês arcaico LUFU, significando
“amizade, amor, afeição”, que foi herança do Germânico LUBO, de raiz
Indo-Europeia LEUBH, “amar, desejar, preocupar-se com”, que por sua vez nasceu
primeiro com as línguas mortas. A linguagem do amor é a linguagem da
necromancia.
Aprendi a declinar a
linhagem da linguagem, a aprendi a piar como os pássaros que cantam tão bem
quanto os lobos fazem sua sinfonia lunar. Aprendi a ser um zológico inteiro,
aliás, o método recai sobre a graças do horoscopo chinês e o I-Ching. Aprendi
que a palavra amor também encontrou uma raiz indo-Europeia que participou da
formação da palavra ‘Mãe’, e com isso aprendi que antes de ir para o inglês o
love teve um tataravô sânscrito lohba, significando
avareza na língua morta, cujo real significado é medo de perder posses, pessoas
e coisas que possui. Aprendi a filtrar a avareza e deixá-la se esvair, para o Love
renascer.
Aprendi que o erro é sempre induzido e empreendido
por duas ou mais pessoas, pois ninguém erra sozinho. E aprendi que não tenho
compromisso com o erro, aprendi a pedir perdão e senti-lo de fato.
Aprendi que a coragem nasceu comigo, mas a
prudência não, essa eu busco nas meditações.
Aprendi que afinal de contas todos nós temos
habilidades defeituosas em escalas diferentes. Aprendi que quando a guerra está
pronta dentro das pessoas, qualquer pessoa serve como oponente. Por isso
aquietei meu imo.
Aprendi que todos nós somos bárbaros por não
falarmos todas as línguas do mundo. Desde que o bárbaro não é o briguento nem o
guerreiro. Quando “barbarói” se tornou a raiz que define aquele que não
compreende a língua do outro, a torre de babel criou todos bárbaros.
Aprendi que a amizade é a lição para a
inimizade, e que amizade é amor sem
caráter biológico!
Aprendi que as pessoas iluminadas têm mais
inimigos do que as pessoas não iluminadas, pois os cegos não perdoam quem
enxerga e os ignorantes não perdoam quem sabe. Aprendi que ser amigável,
amoroso, autêntico, inocente sem causa é suficiente para disparar muitos egos
contra si.
Aprendi que somos eternos aprendizes, que não somos daqui e estamos como
estudantes de tudo, por isso o estudo nunca acaba.
Ensinaram-me que todo mundo é igual quando
ama, sente dor, quando está sentado no vaso sanitário, e quando nasce ou morre
e que a morte é a única certeza que um ser vivo tem. Não existe alguém melhor
ou pior, existe uma série de diversidades. Aprendi que todo mundo enxerga as
bênçãos, mas quando o amargor é maior, a gota transborda no copo e a boca
desabafa. Aprendi a me aceitar como sou e a aceitar todo mundo como cada um é e
aprendi a sorrir por isso.
Aprendi a não elevar a um patamar, nenhum tipo
de padrão de exigência, bem como nenhum tipo de ser que dependa da água para
viver. Os que não se afogam em suas águas, aprendem a nadar. Aprendi enxergar a
luz a partir da caverna de Platão.
Aprendi a não colocar minha cabeça em qualquer
chapéu, já que tem coroas adamantinas em abundancia na natureza.
Aprendi a não julgar um livro pela capa até
mesmo depois de ler o conteúdo, e aprendi a não punir um culpado, mas a salvar
um inocente.
Aprendi que quando o amor existe, não há
necessidade de arranjo legal, desde que o arranjo legal é necessário porque não
há amor, só há direitos. Amor é a fragrância de um coração meditativo,
silencioso e tranquilo; luxúria é paixão cega. O casamento tem se mostrado
servir de conveniência pautada na regra de uma religião que ensina a existência
da traição e que a gente tem que ter posse sobre o sexo alheio ao invés de
sermos donos do nosso. Aprendi que ninguém é de ninguém e que o coração mora em
meu peito, mas não me pertence. Amor não se contrata porque ele é encontrado na
natureza em abundancia, é gratuito, não cobra, não gasta e não faz exigências.
Aprendi que não me cabe decidir quem fica e
quem sai da minha vida, pois tudo está naturalmente como deveria, a menos que o
ser humano ponha a mão. Ensinaram-me que ser dono do meu destino não significa
eu fazer as minhas vontades, mas conhecê-las e conhecer os rumos bons a ser escolhido,
isso é uma boa fortuna.
Em 23 anos de enfermagem eu aprendi a limpar
muita sujidade alheia, aprendi a cuidar e curar, e aprendi que sempre há um
deus bom que limpa a nossa sujidade, que cuida de nós e nos cura.
Aprendi a servir a vida e a morte. Aprendi a
não invejar ninguém, e aprendi que aspirar por ambição é preferível que aspirar
pela ganância. Aprendi a tirar lição disso depois que aprendi sobre o seio bom
e o seio mau de Melaine Klein.
Aprendi a honrar o livre arbítrio e que
caminhar lado-a-lado só é possível quando é chegada a hora. Aprendi que quando
estamos prontos, o mestre aparece, e quando estamos prontos de novo, ele
desaparece.
Aprendi que Abel era o barro e Caim era o
homem de espírito, o primeiro agricultor. Aprendi que quando conhecemos o nome
de algo, ganhamos poder sobre ele. Esse poder é uma responsabilidade
consciente.
Aprendi que perdão vem do latim perdonare,
onde per é total e donare é doar, entregar, a qual se liga a palavra tradição cujo
sentido é entrega e que talvez o perdão seja a primeira tradição que existiu. É
entrega de si.
Aprendi a dar privilégios para a família e
para os mais íntimos, independente de estar ou não sendo recompensado. Aprendi
que não devo enfiar o dedo na ferida de uma pessoa que se encontra moribundo ou
desorientada, pois isso é covardia.
Essa semana fui chamado de muleta, sabe, as
vezes ser muleta de alguém é a boa ação de hoje. Aprendi a doar o melhor de
mim, não o pior. A minha individualidade (individualismo) só serve para eu me
conhecer. Nós somos muletas de todo mundo, inclusive daquela consulente de
tarô, dos irmãos que precisam de cura, do psicólogo que precisa de terapia
urgente para ser resgatado, de um desconhecido, amor em abundância é doação, não
é amparo porque sempre estivemos conectados pelo UNO, basta sintonizar. Uns
cobram pelo ofício de muleta, outros são muletas gratuitas (que também tem em
abundancia no planeta), principalmente em casos de tsunami.
Aprendi que nascemos bons. Que a vida é um
comércio que corrompe as pessoas e prostitui os valores éticos e morais, e
aprendi que a maldade e a bondade estão na cabeça de todos e as escolhas também,
e que quando nos calamos frente a uma injustiça, sem fazermos nada, estamos
sendo maus, desde que a justiça dos homens não socorre aqueles que dormem e eu
aprendi isso sendo acadêmico Forense, onde tive a oportunidade de oferecer mais
de mim também.
Aprendi que quem nos ajuda nunca perde por
ajudar, esses são os mestres, mentores, seja lá qual nome queiram chamar.
Aprendi a não tirar sarro de ninguém e que as ideologias são como as pernas de óculos, só veem se retirar as lentes do rosto.
Aprendi com meus mestres que eles não eram
mestres de ninguém, mas mestres de si mesmos. Sou eu quem chama de mestre as
pessoas as quais me espelhei. Cada gesto deles e cada uma de suas palavras refletiram
a condição de iluminados que eles se encontram. Eles não têm desejo algum de
que alguma coisa seja diferente do que é. Eles não têm discípulos, e se eu me reuni
em torno deles, não foi para segui-los, mas para embeber-me da sua presença e
para me inspirar em seu exemplo. Nos olhos deles, estava sua própria verdade
refletida e aprendi que no meu silêncio eles encontravam com maior facilidade o
silêncio em seu interior. Eles têm muito a compartilhar, eles não querem
liderar, e juntos eles me impulsionaram para que eu encontrasse a minha própria
luz, uma luz que queima com o mesmo gás que abastece a luz deles, em
sincronicidade, em pensamento, em amor.
Aprendi que Amor e humildade são exemplos e
são dois dos muitos atributos de Deus, e aprendi que Deus e deuses também matam,
também conta com o Diabo para fazer o serviço “sujo” das lições de vida. Aprendi
que Deus é infinitamente grande, e é impossível qualquer mortal pecar contra
ele! Aprendi que se sou a imagem e semelhança dele, eu jamais deveria me sentir
ofendido, ou seria vítima de minha própria criação. Então aprendi que quando
não há ofendido, não criamos títulos nem cargos de ofensores. A Criação, ou
melhor dizendo, o Criador nunca é vítima da Criatura.
Aprendi que o Sol irradia luz sem foco, e a meditação
irradia amor sem foco e que o amor nos tira do ego. Amar a si próprio é
meditação, é ser autêntico, aceitar-se como é. Isso é oração, é gratidão. O
amor começa com o amor próprio, com a aceitação de si, de tudo e de todos,
desde que aprendi que ninguém dá o que não tem.
Aprendi a manter a memória para as coisas boas
e as coisas ruins que as pessoas me fazem, isso é um registro, assim como
mantenho a memória sobre o conteúdo do primeiro livro que li.
Aprendi que tempo de convivência e tempo de
permanência são coisas distintas e como é bom enxergar o mundo com os olhos do
outro às vezes.
É com todas essas lições com que venho saudar
a primavera!
Só tenho a agradecer à essa família linda que
me gerou e permitiu tantas descobertas, permitiu minha servidão e o fiz com
tanto prazer e dedicação!
Família significa grupo doméstico, que
inicialmente incluía os servos da casa, chamados de Famuli.
É assim que entro nessa estação, no silêncio do
meu suor que transpira bálsamo, com esse agradecimento imenso, junto de minhas plantas,
as tintas que pintei as paredes do meu templo, da minha casa que chamo de
cantinho gostoso, ouvindo o urutau que canta todas as noites pousado na árvore
que fica acima da janela, bem como os passarinhos que me saúdam todas as
manhãs, cães e gatos que convivem em harmonia, e não poderia deixar de fora os
escorpiões e demais insetos escrotos que aparecem para enfeitar o diagrama da
vida, é assim que contemplo essas reflexões de equinócio!
Schopenhauer disse uma vez que os primeiros
quarenta anos de vida nos dão a inscrição, e os trinta seguintes nos dará a
explanação, e eu pretendo usar a fita métrica para contar cada uma das primeiras verdades de cada primavera daqui para frente.
Feliz Primavera de 2013!
Anno Urbis Conditae 2766.
Sett Ben Qayin