quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A fita métrica das Primas Veritas




Eu aprendi que reflexão e respeito são palavras primas, onde uma significa dobrar-se novamente, a outra significa olhar outra vez, no sentido de revisar. A ideia de que algo mereça um segundo olhar em geral merece respeito.
Como estou na beira das quarenta e uma primaveras, venho agradecer tudo que me foi dado e desejado, mas também agradecer tudo pelo qual dei meu suor. A gratidão é imensa e é essa energia que me motiva um segundo olhar, para reflexão e agradecimento por todo estágio terrestre e espiritual cursados até o momento.
Aprendi desde pequeno a chupar jabuticaba no pé e amora também. Eu acompanhava meu avô no matadouro e ajudava a salgar a carne do boi que morria para nos alimentar, fazíamos mocotó no fogão à lenha e na escola alguns alunos me apelidavam com as alcunhas que mais me ofendia, e eu não compreendia porque isso ocorria. O mocotó que meu avô fazia ficava por horas cozinhando ali. Também pescávamos juntos no Jacaré, o rio próximo de onde morávamos, e eu queria aprender a pescar como ele. Até que um dia pesquei minha primeira tilápia e assim fui adquirindo experiência. Meu avô não pescava para mim, ele me ensinou a pescar o meu próprio peixe.
Aprendi cedo que as mudanças aconteciam dentro e fora de mim, que perdíamos entes queridos, que eu me via de um jeito, mas era visto de outro pelas pessoas ao redor. A fé que eu via ser praticada dentro de casa era diferente e mesclada com que havia lá fora. Aprendi que eu seria discriminado pelo que eu sou e pelo que eu acredito e fui me preparando ao meu modo, os parentes adultos falavam que a superação de obstáculos e dificuldades era uma das responsabilidades e quesito de sobrevivência, e que tudo isso vinha num pacote fechado contendo a parcela de dor que sempre se apresenta para o nosso amadurecimento e esse ensinamento foi reforçado pelas educadoras e educadores que caminham há mais tempo nessa vida.
Ensinaram-me que discursos têm propósitos e que algum dia, um discurso viria para ferir ou curar e que eu tinha de aprender a lidar com isso. Diziam: “não importa o quanto você se esforce, jamais conseguirá agradar a todos e sempre haverá alguém que você ama que um dia irá vestir-se com a capa do vilão só para poder te fazer enxergar mais longe”. No início eu não acreditava nisso, mas com o passar do tempo pude ver com meus próprios olhos. O termo Mahavakya em sânscrito vem significar “discurso”, e especificamente, o discurso sobre um tema filosófico e elevado. Tomei esse exemplo como um bem que me traduz numa boa pessoa se eu achar o caminho que perdoa o vilão. Mas o mais difícil foi descobrir o que eu sentia dentro do peito e dar nome aos bois ou adivinhar o que era tal sentimento que ocorria ali dentro. Foi assim que tentei me desvendar, iniciando um caminho de busca. Graças aos deuses, a generosidade e a compaixão dos adultos sempre circulavam ao meu redor.
Mahavakya Ratnamala diz que o conhecedor da verdade, deve andar pelo mundo sob a aparência estúpida de uma criança, um louco ou um diabo. Então a grande lição que tive é a que tenho de perdoar todo mundo, pois sempre em algum momento da vida somos considerados infantis, às vezes loucos, e muitas vezes diabo de alguém.

Aprendi que debaixo da minha aparência física, existe uma pessoa linda, que aprecia, que ama, que compreende, que admira, e que gosta de receber isso de volta, a maior das lições ainda na infância foi aprender a lidar comigo mesmo nas situações onde eu não recebia isso de volta, e amadureci na marra. Não adianta alguém dizer para você que se você enfiar o dedo na tomada você vai levar um choque. Você tem que levar o choque para aprender que fogo e eletricidade queimam e causam uma série de transformações.

Aprendi que falar com doçura é necessário para desarmar as comportas dos ouvidos, e aprendi que não posso escolher como me sinto, mas posso escolher o que fazer com isso e por essa razão já magoei pessoas que amo quando eu não sabia escolher direito, e já fui magoado por elas também quando eu não sabia filtrar minhas águas. Aprendi que a única linguagem eterna é a do amor, e ela é para todos! Esteja na idade que estiver o amor sempre nos abraça.

A linguagem do amor não cresce conosco, mas nós crescemos com ela. Como disse Shakespeare: “da amizade sincera, amor não é amor se com obstáculo se altera”.
Aprendi a ser simples com os simples, intelectual com os intelectuais, a ser igual com os iguais e a ser desigual com os desiguais, aprendi a ler o que todo mundo lê, e aprendi a não carregar nos ombros mais do que eu suporto. A vida exige isso de nós. Aprendi a amar de várias maneiras, e nenhuma delas parecia ser a correta, porque eu não estava pronto ainda. Só depois de aprender a liberar o amor que estava dentro de mim que então aprendi a amar de fato. Amar sem esperar nada em troca, amar sem criar expectativas, pois essa é a mãe de toda frustração. Aprendi a amar sem endeusar alguém.
É por ver o amor em meu coração, que venho fazer essa reflexão, listar algumas coisas que aprendi e dar graças à tudo isso. Claro que, nem tudo que aprendi poderia ser listado aqui. Eu aprendi a ler o Menestrel de Shakespeare e aos poucos resolvi colocar em prática, é difícil, mas não impossível. Eu aprendi a desabafar nos ouvidos de um bode, e um dia esse bode me falou:
“Sabe Cléber, certa vez, na Grécia Antiga, numa época em que os deuses ainda andavam pela Terra, um espécime de um determinado mamífero plantígrado, o urso, estava passeando pelas planícies calmas da Beócia. Foi quando ele teve o azar de passar perto do lugar onde o deus Hermes estava treinando o arremesso do disco para uma competição que ia ter lugar no Monte Olimpo. Ora, o deus era cheio de habilidades, mas era uma negação no arremesso do disco. Todos já imaginam o que aconteceu: o disco se desviou e bateu na cabeça do pobre urso, que só pensava em achar uma colmeia bem gostosa e nada mais. Furioso da vida, ele se dirigiu para onde estava o deus e o encheu de desaforos. Esqueci de dizer que, nessa época, os ursos eram dotados de cordas vocais e falavam. Ora, o deus, embora culpado, não gostou de ser xingado desse jeito pelo animal. Imediatamente deu a ordem mágica de que esse gênero perdesse o dom da fala. Tanto isso é verdade que a prova está aí: até hoje esse animal não diz uma só palavra. Mas, a partir desse episódio, a união das palavras disco e urso originou Discurso!”

Então o bode filho da viúva me perguntou: “resta saber se você é o urso ou se você é o Hermes, então, qual deles você é?”
Por isso eu trago o Soneto LXXXVIII do William Shakespeare para exemplar o que se passa em meu coração nesse momento, e eu poderia deixar a cargo do leitor para descobrir se sou o urso ou se sou o Hermes, mas o fato é que não sou nenhum dos dois, eu sou apenas o Cléber e quero o seu bem, na forma exata como mostra o Soneto:

“Quando me tratas mau e, desprezado, 

Sinto que o meu valor vês com desdém, 

Lutando contra mim, fico a teu lado 
E, inda perjuro, provo que és um bem. 
Conhecendo melhor meus próprios erros, 
A te apoiar te ponho a par da história 
De ocultas faltas, onde estou enfermo; 
Então, ao me perder, tens toda a glória. 
Mas lucro também tiro desse ofício: 
Curvando sobre ti amor tamanho, 
Mal que me faço me traz benefício, 
Pois o que ganhas duas vezes ganho. 
Assim é o meu amor e a ti o reporto: 
Por ti todas as culpas eu suporto.”


As feridas que não cicatrizam se tornam traumas que são diálogos nada mais que vozes ordenadamente caladas. Mas aprendi que de nada vale abrir a boca para ferir, a menos que conheça o antídoto. Não foi assim que um sábio morreu na cruz suportando as culpas do mundo? Já morri em muitas iniciações, mas nenhuma foi tão trabalhosa e ao mesmo tempo honrosa como essa que senti no último inverno.

Não há inimigos na morte, há amor, perdão e gratidão! Há pessoas que pensam para fazer e há pessoas que têm certeza do que estão fazendo. Eu gosto das que pensam.

Aprendi que alma não tem sexo, e que espírito também não tem. Aprendi a acreditar numa sequencia vital chamada ciclos de reencarnação, por isso já fomos homens, já fomos mulheres, já passamos por todas as cores e sexos, e quem não passou irá certamente passar, assim como a vida renasce em toda primavera.

Aprendi que todo contrário também é verdadeiro, então não vivemos mais de uma vez no mesmo formato, bem como não há morte permanente, assim aprendi que tudo nesse mundo e no outro podem ser questionados, e ainda, que quando alguém abre um discurso contra ou a favor a nós, sempre nos reservamos o direito de defesa. Aprendi que nesse ínterim a bandeira branca que levantamos é sinal que os fantasmas foram vencidos. É nesse sentido primaveril que inicio a jornada em um exílio verdadeiramente pacífico e abstinente de emoções. Aprendi que o único e legítimo sentimento que existe é o amor, o resto é criação mental chamada emoções.

Aprendi que verdades são passageiras, fragmentadas e individuais. E elas sobem ou não uma escada junto conosco. Nessa subida para alcançar o divino, muitas vezes precisamos tomar um passo abaixo na escada, para depois retomar a subida.

Aprendi que tenho de engolir sapos e cobras para me transformar neles e estou aprendendo aos poucos a não fabricar oponentes. Silvanus Yonphá me disse uma vez antes de fazer a passagem:  “Cléber, você sabe o porquê a serpente mãe pica a serpente filha logo que ela nasce? eu respondi que não sabia então ele suavemente e sorridente disse: é para a serpente filha aprender a ser cobra desde cedo!”

Eu aprendi que nós não devemos afastar de nós aquilo que não gostamos, porque justamente o que não gostamos é que encontra ressonância dentro de nós.

Aprendi a falar do sábio, não de mim, eu falo de exemplos que os sábios me deram. Graças aos deuses, até hoje só estive em companhia de gente mais sábia que eu. Durante o processo de aprendizado com esses sábios, eu bati boca muitas vezes, o caminho não é fácil, nunca ninguém disse que era fácil, e eu aceitei. Por isso digo: Eu amo cada um dos meus mestres e mestras que tive. Obrigado por todo vosso ensinamento que me fez ser o que sou hoje.

Aprendi que as primaveras mudam meus pelos e minha pele naturalmente todos os anos, e aprendi a não “ter”, mas “ser”! Aprendi que ninguém consegue deformar alguém sem uma fôrma de bolo ou uma cama de Procusto, e aprendi que não quero isso para mim. Aprendi a me libertar de dogmas, do medo do diabo, do medo de um deus e de alguns vícios, aprendi a buscar algumas virtudes que não nasceram comigo. Aprendi que algumas coisas nessa vida a gente só consegue através do escambo, enquanto outras são conseguidas com o amor.

Aprendi que as 4 estações simplesmente ocorrem, e ocorrem para todos. 
Não importa a orientação filosófica ou religiosa de alguém, ninguém nunca poderá dizer quem você é. Só você pode! só você sabe com que dons ou ausência deles você nasceu.

Dessa forma, para ser GOOD, seria bom entender GOD, que veio do inglês arcaico GOD (virtuoso, desejável, valioso, considerável) e gerou GOOD que tem as qualidades certas para ser aceito e continuar no entre-a-gente, já que aquele veio do Germanico Gothaz que significa “adequado, fazendo parte de”. Aprendi que, meu filho é meu único herdeiro e legítimo descendente, e ele têm me ensinado a ser um bom pai, porque eu não nasci sabendo como é ser um pai.

Aprendi que o Love, também veio do Inglês arcaico LUFU, significando “amizade, amor, afeição”, que foi herança do Germânico LUBO, de raiz Indo-Europeia LEUBH, “amar, desejar, preocupar-se com”, que por sua vez nasceu primeiro com as línguas mortas. A linguagem do amor é a linguagem da necromancia.

Aprendi a declinar a linhagem da linguagem, a aprendi a piar como os pássaros que cantam tão bem quanto os lobos fazem sua sinfonia lunar. Aprendi a ser um zológico inteiro, aliás, o método recai sobre a graças do horoscopo chinês e o I-Ching. Aprendi que a palavra amor também encontrou uma raiz indo-Europeia que participou da formação da palavra ‘Mãe’, e com isso aprendi que antes de ir para o inglês o love teve um tataravô sânscrito lohba, significando avareza na língua morta, cujo real significado é medo de perder posses, pessoas e coisas que possui. Aprendi a filtrar a avareza e deixá-la se esvair, para o Love renascer.

Aprendi que o erro é sempre induzido e empreendido por duas ou mais pessoas, pois ninguém erra sozinho. E aprendi que não tenho compromisso com o erro, aprendi a pedir perdão e senti-lo de fato.
Aprendi que a coragem nasceu comigo, mas a prudência não, essa eu busco nas meditações.

Aprendi que afinal de contas todos nós temos habilidades defeituosas em escalas diferentes. Aprendi que quando a guerra está pronta dentro das pessoas, qualquer pessoa serve como oponente. Por isso aquietei meu imo.

Aprendi que todos nós somos bárbaros por não falarmos todas as línguas do mundo. Desde que o bárbaro não é o briguento nem o guerreiro. Quando “barbarói” se tornou a raiz que define aquele que não compreende a língua do outro, a torre de babel criou todos bárbaros.

Aprendi que a amizade é a lição para a inimizade, e que amizade é amor sem caráter biológico!
Aprendi que as pessoas iluminadas têm mais inimigos do que as pessoas não iluminadas, pois os cegos não perdoam quem enxerga e os ignorantes não perdoam quem sabe. Aprendi que ser amigável, amoroso, autêntico, inocente sem causa é suficiente para disparar muitos egos contra si.

Aprendi que somos eternos aprendizes, que não somos daqui e estamos como estudantes de tudo, por isso o estudo nunca acaba.
Ensinaram-me que todo mundo é igual quando ama, sente dor, quando está sentado no vaso sanitário, e quando nasce ou morre e que a morte é a única certeza que um ser vivo tem. Não existe alguém melhor ou pior, existe uma série de diversidades. Aprendi que todo mundo enxerga as bênçãos, mas quando o amargor é maior, a gota transborda no copo e a boca desabafa. Aprendi a me aceitar como sou e a aceitar todo mundo como cada um é e aprendi a sorrir por isso.

Aprendi a não elevar a um patamar, nenhum tipo de padrão de exigência, bem como nenhum tipo de ser que dependa da água para viver. Os que não se afogam em suas águas, aprendem a nadar. Aprendi enxergar a luz a partir da caverna de Platão.
Aprendi a não colocar minha cabeça em qualquer chapéu, já que tem coroas adamantinas em abundancia na natureza.
Aprendi a não julgar um livro pela capa até mesmo depois de ler o conteúdo, e aprendi a não punir um culpado, mas a salvar um inocente.

Aprendi que quando o amor existe, não há necessidade de arranjo legal, desde que o arranjo legal é necessário porque não há amor, só há direitos. Amor é a fragrância de um coração meditativo, silencioso e tranquilo; luxúria é paixão cega. O casamento tem se mostrado servir de conveniência pautada na regra de uma religião que ensina a existência da traição e que a gente tem que ter posse sobre o sexo alheio ao invés de sermos donos do nosso. Aprendi que ninguém é de ninguém e que o coração mora em meu peito, mas não me pertence. Amor não se contrata porque ele é encontrado na natureza em abundancia, é gratuito, não cobra, não gasta e não faz exigências.

Aprendi que não me cabe decidir quem fica e quem sai da minha vida, pois tudo está naturalmente como deveria, a menos que o ser humano ponha a mão. Ensinaram-me que ser dono do meu destino não significa eu fazer as minhas vontades, mas conhecê-las e conhecer os rumos bons a ser escolhido, isso é uma boa fortuna.

Em 23 anos de enfermagem eu aprendi a limpar muita sujidade alheia, aprendi a cuidar e curar, e aprendi que sempre há um deus bom que limpa a nossa sujidade, que cuida de nós e nos cura.

Aprendi a servir a vida e a morte. Aprendi a não invejar ninguém, e aprendi que aspirar por ambição é preferível que aspirar pela ganância. Aprendi a tirar lição disso depois que aprendi sobre o seio bom e o seio mau de Melaine Klein.

Aprendi a honrar o livre arbítrio e que caminhar lado-a-lado só é possível quando é chegada a hora. Aprendi que quando estamos prontos, o mestre aparece, e quando estamos prontos de novo, ele desaparece.

Aprendi que Abel era o barro e Caim era o homem de espírito, o primeiro agricultor. Aprendi que quando conhecemos o nome de algo, ganhamos poder sobre ele. Esse poder é uma responsabilidade consciente. 

Aprendi que perdão vem do latim perdonare, onde per é total e donare é doar, entregar, a qual se liga a palavra tradição cujo sentido é entrega e que talvez o perdão seja a primeira tradição que existiu. É entrega de si.

Aprendi a dar privilégios para a família e para os mais íntimos, independente de estar ou não sendo recompensado. Aprendi que não devo enfiar o dedo na ferida de uma pessoa que se encontra moribundo ou desorientada, pois isso é covardia.

Essa semana fui chamado de muleta, sabe, as vezes ser muleta de alguém é a boa ação de hoje. Aprendi a doar o melhor de mim, não o pior. A minha individualidade (individualismo) só serve para eu me conhecer. Nós somos muletas de todo mundo, inclusive daquela consulente de tarô, dos irmãos que precisam de cura, do psicólogo que precisa de terapia urgente para ser resgatado, de um desconhecido, amor em abundância é doação, não é amparo porque sempre estivemos conectados pelo UNO, basta sintonizar. Uns cobram pelo ofício de muleta, outros são muletas gratuitas (que também tem em abundancia no planeta), principalmente em casos de tsunami.

Aprendi que nascemos bons. Que a vida é um comércio que corrompe as pessoas e prostitui os valores éticos e morais, e aprendi que a maldade e a bondade estão na cabeça de todos e as escolhas também, e que quando nos calamos frente a uma injustiça, sem fazermos nada, estamos sendo maus, desde que a justiça dos homens não socorre aqueles que dormem e eu aprendi isso sendo acadêmico Forense, onde tive a oportunidade de oferecer mais de mim também.

Aprendi que quem nos ajuda nunca perde por ajudar, esses são os mestres, mentores, seja lá qual nome queiram chamar.

Aprendi a não tirar sarro de ninguém e que as ideologias são como as pernas de óculos, só veem se retirar as lentes do rosto.

Aprendi com meus mestres que eles não eram mestres de ninguém, mas mestres de si mesmos. Sou eu quem chama de mestre as pessoas as quais me espelhei. Cada gesto deles e cada uma de suas palavras refletiram a condição de iluminados que eles se encontram. Eles não têm desejo algum de que alguma coisa seja diferente do que é. Eles não têm discípulos, e se eu me reuni em torno deles, não foi para segui-los, mas para embeber-me da sua presença e para me inspirar em seu exemplo. Nos olhos deles, estava sua própria verdade refletida e aprendi que no meu silêncio eles encontravam com maior facilidade o silêncio em seu interior. Eles têm muito a compartilhar, eles não querem liderar, e juntos eles me impulsionaram para que eu encontrasse a minha própria luz, uma luz que queima com o mesmo gás que abastece a luz deles, em sincronicidade, em pensamento, em amor.

Aprendi que Amor e humildade são exemplos e são dois dos muitos atributos de Deus, e aprendi que Deus e deuses também matam, também conta com o Diabo para fazer o serviço “sujo” das lições de vida. Aprendi que Deus é infinitamente grande, e é impossível qualquer mortal pecar contra ele! Aprendi que se sou a imagem e semelhança dele, eu jamais deveria me sentir ofendido, ou seria vítima de minha própria criação. Então aprendi que quando não há ofendido, não criamos títulos nem cargos de ofensores. A Criação, ou melhor dizendo, o Criador nunca é vítima da Criatura.

Aprendi que o Sol irradia luz sem foco, e a meditação irradia amor sem foco e que o amor nos tira do ego. Amar a si próprio é meditação, é ser autêntico, aceitar-se como é. Isso é oração, é gratidão. O amor começa com o amor próprio, com a aceitação de si, de tudo e de todos, desde que aprendi que ninguém dá o que não tem.

Aprendi a manter a memória para as coisas boas e as coisas ruins que as pessoas me fazem, isso é um registro, assim como mantenho a memória sobre o conteúdo do primeiro livro que li.

Aprendi que tempo de convivência e tempo de permanência são coisas distintas e como é bom enxergar o mundo com os olhos do outro às vezes.

É com todas essas lições com que venho saudar a primavera!

Só tenho a agradecer à essa família linda que me gerou e permitiu tantas descobertas, permitiu minha servidão e o fiz com tanto prazer e dedicação!
Família significa grupo doméstico, que inicialmente incluía os servos da casa, chamados de Famuli.

É assim que entro nessa estação, no silêncio do meu suor que transpira bálsamo, com esse agradecimento imenso, junto de minhas plantas, as tintas que pintei as paredes do meu templo, da minha casa que chamo de cantinho gostoso, ouvindo o urutau que canta todas as noites pousado na árvore que fica acima da janela, bem como os passarinhos que me saúdam todas as manhãs, cães e gatos que convivem em harmonia, e não poderia deixar de fora os escorpiões e demais insetos escrotos que aparecem para enfeitar o diagrama da vida, é assim que contemplo essas reflexões de equinócio!

Schopenhauer disse uma vez que os primeiros quarenta anos de vida nos dão a inscrição, e os trinta seguintes nos dará a explanação, e eu pretendo usar a fita métrica para contar cada uma das primeiras verdades de cada primavera daqui para frente.


Feliz Primavera de 2013!

Anno Urbis Conditae 2766.

Sett Ben Qayin



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